domingo, abril 28, 2002

Ciclo

Era a terceira vez que ela passava por ali. Parecia querer se fazer notar, pedir olhares atentos e pensamentos ansiosos. Caminhava com calma, como se o tempo tivesse parado e ela não quisesse ir a lugar algum.

Era a terceira vez que ele a via passar à sua frente. Seus olhos não conseguiam ser indiferentes e mais uma vez a seguiam afoitos. Sentia-se dividido entre falar algo ou apenas seguir contemplando-a, mesmo sabendo que qualquer uma dessas atitudes constituia-se como inútil.

Ela pára. Vira-se para trás. Seus olhares se cruzam por um breve instante. Ele respira fundo. Abre a boca como se fosse mencionar algo, mas desiste e abaixa a cabeça. Nela, o sorriso que se principiava logo desaparece, dando espaço à vaguidão. Vira-se novamente e segue seu caminho. Ele permanece sentado.

O dia ainda era claro quando ele se levantou e se colocou a andar sem rumo certo. Não sabia ao certo quanto tempo se passara - segundos, minutos, talvez horas. Ela não estava mais presente. Fora vencido mais uma vez por sua inconstância, ainda que tenha visto naquele olhar uma esperança perdida.

Um vazio tomou-lhe o peito. Estava sozinho, tal qual imaginara um dia estar por se fechar em um mundo de medo. Angustiado, olhou para a frente e decidiu continuar, já se acostumando às derrotas diárias em tentativas quase sempre inexistentes. Não haveria de ser diferente agora.

Era a última vez que ele parava por ali.