terça-feira, julho 26, 2005

Quando dois e dois são nada

Duas vezes eles se viram, e não mais do que isso seria necessário.

Na primeira, mal trocaram olhares, tímidos ou receosos que eram - só notaram um ao outro, o que bastava naquele espaço mínimo onde pessoas dançavam despretensiosamente. Eram dois estranhos em um lugar mais estranho ainda, com pessoas que pareciam se ignorar, fechadas em seus mundos de luzes, álcool e som. A eles só restava a solidão da normalidade, de quem ainda achava que o ser humano nasceu para se relacionar com o outro, mas eram traídos pela própria falta de iniciativa, e assim ficavam como todos os demais, fingindo não perceber nada que se passava à sua volta. Seria uma noite curta, ainda que eles não a sentissem assim.

Ela queria pegar sua mão. Ele, dizer coisas ao seu ouvido. Só que se afastavam, quase alcançando o limite das paredes. Saíram de lá em horas ímpares, sem serem um par. Sem esperança de se reencontrarem também.

O segundo encontro parecia inadequado, mas inevitável. Fazia sol, havia gente na rua e pouco espaço para pensar. Eles eram filme, e se esbarraram de repente. Ela sorriu desajeitada, ele pegou sua bolsa caída ao chão. Pediram desculpas, mas não se foram. Também nada diziam. Sabiam que não eram dois quaisquer, mas não sabiam como agir para não sê-los. Atabalhoados, seguiram adiante. Ônibus e carros também. Ela na contramão do fluxo, ele na contramão da vida. Talvez pudessem ser felizes assim.

Mas seria o mesmo se ela tivesse olhado para trás?