sexta-feira, setembro 30, 2011

#1 Crush

O silêncio era longo, tão longo quanto a distância que ela havia colocado entre nós. Nem a mesma música tocava mais, cansada que ficou de ecoar suas notas em um coração vazio. Era um deixar de existir quieto, furtivo. Um apagar. Como se estivesse fugindo dela e, assim, de mim mesmo. Para encontrar um lugar longe do preto-e-branco da vida comum. Para descobrir um canto onde eu mesmo quisesse estar. Mas sempre existe a lembrança do beijo, e assim ela acaba por voltar. E dá cores para um mundo sem vida, põe música onde a quietude deveria reinar. Insuportável. Porque a alegria da lembrança esconde a realidade solitária, aquela que tenta ser aplacada com filmes, discos e livros – que passam por mim sem dizer nada também. Assim eu continuo acreditando, mesmo sem saber no que devo acreditar. São referências, vontades, momentos a compartilhar. Enquanto isso, o silêncio é longo. Enquanto isso, a vida insiste em passar.

Ela só está feliz quando chove. Eu só fico triste por não saber como fazer para que o fim não seja sempre igual. E logo me conformo com pontos finais quando as reticências precisariam existir. Quando é ela, acontece; na dúvida, não falo, e tudo fica quieto lá fora, enquanto o barulho que surge aqui dentro parece querer me matar. E ela está longe demais para ouvir.

Eu nunca gostei de pausas longas. Por isso, ela precisa voltar.

(mas não vai)

sexta-feira, setembro 09, 2011

Quatro taças

“Então você prefere que eu minta para você?”

Ele não sabia o que responder. Um pouco por não saber mais o que havia sido verdade em toda aquela história, outro pouco por não saber se queria continuar a se enganar. A verdade é que sempre viveram farsas, desde o dia em que se conheceram até a tarde em que se despediram, e não parecia fazer sentido buscar algo fora do comum agora. Talvez por isso tivesse vontade de perguntar a ela que diferença faria se ela mentisse mais uma vez.

“Eu quero que você seja sincera.”

Ela já havia sido. O problema é que ele não aceitava, dizendo que era impossível tudo o que ela disse um dia ser tão forte e tão exato ter se acabado assim. Mas acabou. Ela não mentia. Não agora. Foram uma farsa por muitas vezes, talvez todas, revestidos de casal-perfeito-que-está-sempre-feliz, só que não dava mais para seguir. Por isso, a recusa. Por isso, a despedida. Abandonar parecia uma saída; ficar junto, um martírio. Tinha certezas. Não tinha coragem.

“Já não sei mais o que fazer.”

Então não faz. Fica aqui. Deixa como está. Vamos tentar de novo. Pode funcionar. A gente aprende com os erros. Temos tantos planos. Nosso sexo é bom. Nossas famílias se adoram. Nossos amigos não querem se separar. Queremos um cachorro. Não queremos filhos. Você foi feita para mim. Eu não me vejo sem você. Não vai embora. Não desiste agora. Não faz assim.

“Nem eu.”

Por favor, desiste. Eu não sirvo para você. Sou ruim. Sou insensível. Prefiro viver só. Nunca vai funcionar. Por isso eu menti. Por isso eu preciso partir. Não temos mais nada a construir. A sua vida vai se ajeitar. Seus amigos vão estar com você. Compra uma passagem. Faz uma viagem. Descobre o seu mundo. Não fica por aqui. Não baseie sua existência em mim.

“É melhor eu ir.”

Vocês não podem sair assim. O que vai restar daqueles que ainda acreditavam no amor? Dos que viram a relação crescer? Dos que apoiaram, insistiram, ouviram, falaram? Não é justo, não acham? Vocês podiam tentar mais. Vocês tem tudo para dar certo. Não se abandonem. Não desistam. O amor salva tudo. E vocês têm o principal. Fiquem. Por favor.

“É melhor eu desistir.”

Um dia vocês vão se arrepender.