quinta-feira, fevereiro 21, 2002

Acontece Por Aí

- Olha nos meus olhos quando falar comigo!

- Eu não consigo...

- Olha! Quero ver se você está sendo sincero!

- Pára com isso. Você sabe que eu tô falando a verdade...

- Sei... se tivesse, olhava pra mim! Não ficava aí mirando o nada...

- Você tá entendendo errado... não é isso...

- Como assim? Por que você não me olha então?

- Porque senão não vou agüentar e vou te beijar...

- E quem disse que não é isso o que eu quero?

domingo, fevereiro 10, 2002

Lúgubre Relicário

Queria ter o mundo em suas mãos. Gostava de ser o centro das atenções, de estar rodeada de pessoas que a admirassem. Sempre fôra muito popular em todos os lugares que freqüentava, e alimentara seu ego por anos a fio. Não era de se admirar que logo começasse a pensar que todos estavam aos seus pés e a fazer o que bem entendesse daqueles com quem convivia.

Entretanto, parecia não conseguir entender o que havia feito de errado para estar agora naquele estado. Já bebia há algumas horas, e as várias garrafas de vinho vazias jogadas pela casa denunciavam o seu alto grau de embriaguez. Chorava compulsivamente, enquanto via da janela de seu apartamento as luzes acesas de uma cidade que um dia acreditou ser sua.

Agora estava ali, largada na sala semi-escura, com a tv passando algum filme em preto e branco e as roupas espalhadas pelo sofá. Tinha telefonado para várias pessoas, e todos respondiam a mesma coisa quando indagadas se estavam dispostas a fazer algo: "sinto muito, já tenho compromisso para hoje". Não haveria nada de anormal nisso se não fosse pelo fato de tal frase vir sendo repetida incessantemente ao longo de várias semanas em seus ouvidos.

Caminhou até o armário e pegou mais uma garrafa de vinho. Com raiva, arrancou a rolha e atirou-a pela janela, observando com singular prazer a queda. Não despejou uma gota em sua taça; preferiu entornar a bebida diretamente na boca, deixando que o excesso escorresse por seu rosto e seu corpo. O conteúdo inteiro desapareceu do recipiente em poucos minutos.

Toda a casa parecia tremer agora. Cambaleante, andou até o sofá e sentou-se, levando as mãos à cabeça. Mais lágrimas rolaram de seus olhos. Tentou deitar-se para adormecer um pouco, porém não conseguia deixar de pensar em como seu mundo estava ruindo agora. Quebrou a garrafa que estava ao seu lado com um gesto bruto e certeiro, acertando o espelho que insistia em refletir aquela cena.

Aos poucos, foi se recompondo. Ponderou que não podia permanecer daquela maneira e passou a se acalmar. Talvez estivesse exagerando. Talvez fosse apenas uma fase ruim. Talvez. Abriu um pequeno sorriso, imaginando o qüão engraçado seria quando descobrisse que tudo era fruto de sua imaginação, que as pessoas continuavam a admirá-la tanto quanto antes, quem sabe até mais, e que realmente só não vinham tendo tempo para encontrá-la.

O toque da campanhia a despertou de tão profícuos pensamentos. Olhou para o relógio e percebeu que passava da meia-noite. Não esperava nenhuma visita, por isso ficou bastante intrigada. Foi até a porta e tentou, pelo olho mágico, ver quem era. O corredor escuro, entretanto, não tornou isso possível. Relutou em abrir, mas o toque incessante e compassado acabou a convencendo. Girou a maçaneta e, lentamente, puxou a porta em sua direção.

Tal gesto não durou pouco mais do que alguns segundos, porém foi suficiente para elevar assustadoramente seus batimentos cardíacos. Os braços, trêmulos, pareciam querer recuar, talvez pressentindo que algo de ruim estava para acontecer. O cérebro, no entanto, permitiu que seguisse adiante, ignorando os apelos do seu lado emocional. Sentia uma forte tensão ali, mas preferiu continuar.

O ambiente à meia-luz deu o tom certo para o que aconteceu a seguir. Já com a porta aberta, um vulto jogou-a para dentro do apartamento.O alto grau de embriaguez favoreceu a queda, fazendo com que ela derrubasse tudo que havia no caminho até o chão. Tentou berrar algo, mas uma mão ágil tampou sua boca antes que assim o fizesse. Com os braços, procurava acertar aquele corpo que estava agora sobre o seu, só que esbarrava em sua própria debilidade.

Desesperou-se. Mexia-se de todas as formas, buscando livrar-se daquela situação. Foi então surpreendida por um forte cheiro, algo que lhe parecia bem familiar. Quando o pano úmido aproximou-se de seu nariz, pôde ter a certeza do que era. Éter. Nesse momento, tomou consciência do que estava por acontecer e viu que não haveria muito mais a ser feito.

Eram cerca de 11 horas da manhã quando despertou. Estava no chão da sala, no mesmo local da madrugada anterior. Olhou para os lados e reparou que estava sozinha. Sua roupa estava intocada, assim como todo o apartamento. Avistou as garrafas de vinho vazias e a mancha na parede, e viu que a porta estava fechada, trancada por dentro.

O vidro de uma das janelas da sala quebrado foi o que comprovou que não havia sido apenas um sonho aquilo tudo.

O que fôra, porém, parecia ter se perdido na memória, em um mistério que lhe perseguiu até sua morte. Desse dia em diante, sempre que se olhava no espelho perguntava a si mesma o porquê de não ter perdido sua vida naquela madrugada, evitando o sofrimento de conviver diariamente com a solidão que se tornara uma constante desde que fôra jogada ao abandono por todos aqueles que um dia ela pensou estarem aos seus pés.

quarta-feira, fevereiro 06, 2002

Não, caros leitores, eu não morri e nem acabei com o "Rumo Ao Nada".

Peço desculpas pela ausência prolongada, mas é que estive viajando por alguns dias e não tinha como acessar com freqüência onde estava.

De qualquer forma, já estou de volta e pretendo retomar a rotina de textos ainda hoje.

Volte em breve aqui e confira!

Um grande abraço,

Marcelo Caldas