segunda-feira, fevereiro 27, 2006

Atores Perfeitos

Ele se virou para o lado e os seus olhares cruzaram novamente. Apesar do tempo longe, foi capaz de sentir aquilo da mesma forma que há mais de um ano. A respiração se manteve forte, o orgulho também, e em poucos segundos já fingia que nada havia acontecido, que estava imune àquele reencontro.

Mas não estava. E ela sabia disso, e parecia olhá-lo ainda mais fixamente, com a certeza de quem um dia foi capaz de enxergar muito além da superfície dura e arrogante. Suas mãos eram as mesmas, trêmulas, só as unhas tomadas de cor se afastavam do passado. Ela havia mudado, sem dúvidas. Mas não tanto que ele também não a reconhecesse.

Falaram. Ele falou. Ela tentava. Havia uma tensão no ar, algo que qualquer um seria capaz de prever, menos os tolos que se consideram imunes ao que vem quando se mexe em baús de antiguidades. É como olhar uma foto antiga e não se perguntar o que passava na cabeça naquele momento. Ou ouvir uma música de outra década e não ser tomado pelas reminiscências de uma situação qualquer. Ilusões próprias. Necessárias para a sanidade.

E então veio o objeto. "Afinal, foi para isso que viemos aqui, não é?". Não, óbvio que não. Eles foram para estudar um ao outro, ver quem sobreviveu melhor, quem percorreu outro caminho, quem consegue ser inabalável, quem é mais forte... ou quem cede primeiro. Porque alguém vai ceder, vai dar o primeiro toque, o primeiro passo, e se render ao inevitável do reencontro.

Não. São olhares, gestos ensaiados, tímidos, pensados, relutantes. Distantes, ainda que próximos. Não avançam. Não podem avançar. Aprenderam a ser românticos e dali nada farão.

Talvez tudo vire palavras. Costumam ser assim. Dizem para si o que não diriam para o outro. Defender.

Foi para isso que voltaram ali. E ainda voltarão.