Quando
a porta se fechou, depois do último beijo, foi como se meu coração parasse por
alguns momentos. O silêncio que reinava na casa contrastava ainda com o seu
cheiro espalhado no ar. Meus olhos, vermelhos, evitavam os ambientes que
fizeram parte de nossa história. Minhas mãos cerradas tentavam,
desesperadamente, agarrar algo que já não existia mais. Você estava indo, eu
sabia, e eu só podia lamentar que as minhas escolhas nos levassem até ali.
Nunca quis tanto saber dizer o que sentia. Desejei saber colocar em gestos todo
o meu gostar. Quis voltar no tempo para responder a você da maneira correta no
momento em que eu não podia falhar. Mas não posso. Falhei. Não disse, não
mostrei, não vivi. Deixei que os meses juntos fossem perdendo em força, medroso
que fui em não assumir o óbvio. Esperei
o momento certo para ter você e ele passou porque eu não quis assumir. Por
isso, quando a porta se fechou, estava eu de um lado e você do outro. Por isso,
o último beijo dado não foi apenas mais um de muitos. Por isso, a esperança do
retorno passou a ser tudo o que restou. Porque não há mais desculpas que possam
salvar nós dois. Não há mais pedidos que possam te deixar aqui. Devia eu ter
aceitado as incoerências e vivido o que tínhamos de especial. Agora, é silêncio,
é dor, é ausência. É vontade de que, um dia, você volte. Afinal, o lugar, você
sabe, ainda é seu – “que mora no meu coração”, não era assim?
quarta-feira, novembro 28, 2012
Casanova lament
Quando ela puxou seu braço e ele a olhou mais uma vez, a chuva já caía forte e era hora de ir. Havia a expectativa de um beijo, e aquela troca de olhares pedia uma urgência que não cabia hesitar. Foram segundos. "Tchau, então". "Tchau".
Ela caminhou firme enquanto ele a via partir, já de dentro do carro. Não houve olhar para trás. Mas ele, como ninguém, sabia que tinha deixado o momento escapar. Perdera a cena perfeita. Logo ele, tão afeito à ficção que vivia a sonhar com algo assim. Logo com ela, recém-saída de suas páginas para a vida. Falhara?
Sim, falhara. Ainda que, romanticamente, pudesse pensar que o retardar tornava a conquista mais valiosa, sabia que não conseguiria dormir com a angústia do não ocorrido. Pensou em telefonar, descer do carro, enfrentar a tempestade. Mas a esquina já ia longe, e o beijo também. Resignou-se. O abraço seria tudo que teria para lembrar.
"O senhor quer um pouco de ar?" - o taxista ainda comentou.
"Você não imagina como..."
Ela caminhou firme enquanto ele a via partir, já de dentro do carro. Não houve olhar para trás. Mas ele, como ninguém, sabia que tinha deixado o momento escapar. Perdera a cena perfeita. Logo ele, tão afeito à ficção que vivia a sonhar com algo assim. Logo com ela, recém-saída de suas páginas para a vida. Falhara?
Sim, falhara. Ainda que, romanticamente, pudesse pensar que o retardar tornava a conquista mais valiosa, sabia que não conseguiria dormir com a angústia do não ocorrido. Pensou em telefonar, descer do carro, enfrentar a tempestade. Mas a esquina já ia longe, e o beijo também. Resignou-se. O abraço seria tudo que teria para lembrar.
"O senhor quer um pouco de ar?" - o taxista ainda comentou.
"Você não imagina como..."
terça-feira, novembro 13, 2012
Candelabros
As luzes acesas lá fora ainda são opacas, mas isso não me incomoda. Prefiro a boa música que ecoa em minha sala ou o frio que chegou precocemente em mim. Enquanto isso, a cerveja que você deixou à mesa apenas esquenta, junto com a vontade de que o seu retorno possa acontecer. Enquanto isso, você caminha na chuva, misturando as gotas com as lágrimas e fingindo sorrir. Quase tudo igual. Sempre soubemos que eram outros os nossos caminhos, e que as mãos dadas não tardariam em desatar. Não me incomoda. Há tempos aprendi que a travessia pode valer mais do que o chegar. Talvez você lamente. Talvez você me odeie. Talvez tenha deixado para lá. Tanto faz. Eu pego outra cerveja. Eu deixo você não estar. Porque a música é boa, o frio também. A luz aqui dentro é mais do que metáfora. A chuva não cai sobre mim. Então invento alguém que eu saiba onde encontrar. E vivo minha ficção porque a realidade em que você está já não é a que me satisfaz.
sábado, outubro 13, 2012
Pausa, descompasso
Por não poder chorar, ela fechou os olhos. Não devia ter mais do que 5 anos quando isso começou, fugindo das dores que a primeira queda da vida lhe ofereceu. Era apenas um balanço, era apenas um corte, mas já sentia, ali, que o mundo não era um lugar para sofrer. Agora, quando caía mais uma vez, não parecia disposta a se entregar ao sentir. Por isso, respirou fundo e deixou seu pensamento migrar até onde tudo era apenas vazio, silêncio, ausência. Foi simples. Estava acostumada a sair de si. Na verdade, o problema era voltar. Sabia que, quando os olhos se abrissem, teria que encontrar tudo que tentava esconder nas sombras do próprio interior. Então prolongava o momento até quase não mais existir. Nem ele, nem ela. Como se pudesse ir além. Como se pudesse ir.
Mesmo sabendo que qualquer lugar seria longe demais de onde ela realmente queria estar.
terça-feira, agosto 21, 2012
Adiante
A porta
que ficou aberta depois que você saiu. A cama que eu não quis
arrumar depois da última noite que você esteve aqui. A música que
não posso mais ouvir. A foto que não posso olhar. Tudo que ficou no
lugar que não devia estar. Por isso, o silêncio reina aqui. Por
isso, as cores não conseguem chegar. Quanta perda de tempo. Não há
por que não facilitar. São dois passos para frente e um não olhar
para trás. Simples. Assim. Eu não acho que saiba como fazer. Mas
faço. Um, dois, adeus.
Pronto.
quarta-feira, junho 20, 2012
Deslizes
Então ele descobriu a dor do silêncio. Nunca havia ansiado tanto por palavras até se deparar com a frieza da mudez que dela emanava. Não era constante, verdade. Mas a cada vez que os sons desapareciam, sua alma se enchia de uma angústia que parecia não ter fim. Por isso, precisava falar. Dizia tudo o que pensava, o que sentia, o que sequer sabia sentir. E preenchia os vazios com toda sorte de vocábulos, como se pudesse expressar o mundo por meio deles. Nada mais inútil. Palavras não são capazes de abarcar o que vem de dentro, e os gestos que rareiam quando ele prefere (se) explicar são aquilo que ela mais deseja ter. E então vem o abismo, a distância, o desencontro. Porque ingênuo é aquele que acredita que nas diferenças é que se encontra o complemento. Não. É preciso o par, o igual, o um-para-o-outro. Caso contrário, o silêncio vira regra, o vazio vira lógica, a dúvida vira certeza. E isso, eles sabem, é menos do que eles podem construir.
Então ele descobriu a dor do silêncio. Nunca havia ansiado tanto por palavras até se deparar com a frieza da mudez que dela emanava. Não era constante, verdade. Mas a cada vez que os sons desapareciam, sua alma se enchia de uma angústia que parecia não ter fim. Por isso, precisava falar. Dizia tudo o que pensava, o que sentia, o que sequer sabia sentir. E preenchia os vazios com toda sorte de vocábulos, como se pudesse expressar o mundo por meio deles. Nada mais inútil. Palavras não são capazes de abarcar o que vem de dentro, e os gestos que rareiam quando ele prefere (se) explicar são aquilo que ela mais deseja ter. E então vem o abismo, a distância, o desencontro. Porque ingênuo é aquele que acredita que nas diferenças é que se encontra o complemento. Não. É preciso o par, o igual, o um-para-o-outro. Caso contrário, o silêncio vira regra, o vazio vira lógica, a dúvida vira certeza. E isso, eles sabem, é menos do que eles podem construir.
domingo, abril 08, 2012
Matinê
Ela se sentou de novo naquele café de rua e suspirou. Olhar pelo vidro o velho cinema abandonado, lugar de tantas memórias, era entrar em contato com sua primeira infância, aquela em que as cores e os cheiros eram únicos e, por isso, inesquecíveis. Já ia longe o tempo, e a vida agora era tomada de preto e branco, inodora, típica da mediocridade dos dias adultos. E assim carregava em seu semblante o pesar de quem lamentava a passagem dos anos, bem diferente do brilho que sobressaía de seu olhar em fotos de quando era pequena. Com as memórias se consolava, deixando a realidade distante de si.
Sonhava.
Talvez por isso não tenha contido o sorriso ao avistar aquele senhor vendendo balões de gás em frente à bilheteria, como se a qualquer momento uma fila de pequeninos fosse se formar transbordando genuína alegria. Talvez por isso as lágrimas tenham rolado de seu rosto quando o pipoqueiro de cabelos grisalhos mais uma vez chegou com seu carrinho. Talvez por isso as luzes que se acenderam do outro lado da rua tenham iluminado sua face como da primeira vez que as vira.
Vivia.
O café já não a esquentava mais. As vozes já não mais ecoavam no salão. Suas mãos, antes trêmulas, eram firmes novamente. Levantou-se. A cada passo, sentia o mundo crescer à sua volta. Os carros em velocidade baixa, as árvores verdes, o ar puro. Corria livre, sem o peso que a idade lhe trouxera. As crianças, de repente, tomavam a rua, felizes como sempre devem ser. Havia música, e por isso bailou mais uma vez. Os olhos fechados, os braços abertos, o coração preenchido. A pipoca, o balão, as luzes.
O filme.
O fim.
Ela se sentou de novo naquele café de rua e suspirou. Olhar pelo vidro o velho cinema abandonado, lugar de tantas memórias, era entrar em contato com sua primeira infância, aquela em que as cores e os cheiros eram únicos e, por isso, inesquecíveis. Já ia longe o tempo, e a vida agora era tomada de preto e branco, inodora, típica da mediocridade dos dias adultos. E assim carregava em seu semblante o pesar de quem lamentava a passagem dos anos, bem diferente do brilho que sobressaía de seu olhar em fotos de quando era pequena. Com as memórias se consolava, deixando a realidade distante de si.
Sonhava.
Talvez por isso não tenha contido o sorriso ao avistar aquele senhor vendendo balões de gás em frente à bilheteria, como se a qualquer momento uma fila de pequeninos fosse se formar transbordando genuína alegria. Talvez por isso as lágrimas tenham rolado de seu rosto quando o pipoqueiro de cabelos grisalhos mais uma vez chegou com seu carrinho. Talvez por isso as luzes que se acenderam do outro lado da rua tenham iluminado sua face como da primeira vez que as vira.
Vivia.
O café já não a esquentava mais. As vozes já não mais ecoavam no salão. Suas mãos, antes trêmulas, eram firmes novamente. Levantou-se. A cada passo, sentia o mundo crescer à sua volta. Os carros em velocidade baixa, as árvores verdes, o ar puro. Corria livre, sem o peso que a idade lhe trouxera. As crianças, de repente, tomavam a rua, felizes como sempre devem ser. Havia música, e por isso bailou mais uma vez. Os olhos fechados, os braços abertos, o coração preenchido. A pipoca, o balão, as luzes.
O filme.
O fim.
quinta-feira, janeiro 19, 2012
Sobre mares e amores
Quando ela apareceu e ele se viu completamente perdido, o universo parecia comum. Havia sol, havia árvores, havia vida. Só não havia ar. E então ela foi entrando, tomando conta, arrastando tudo como uma vaga do mar em tardes de inverno. A ele, apenas restava tentar colocar a cabeça para fora d'água e respirar, já que ir contra a correnteza de nada servia. Por isso, acabou se deixando levar e, quando viu, não podia manter mais os pés em terra firme. Enquanto isso, ela parecia sumir e voltar, seguindo a intensidade do oceano. Ali, o mundo era mudo. Ali, o coração era surdo. Às vezes ele tentava nadar em sua direção, crendo que era possível chegar até ela. Porém, o esforço era inútil, e o mar cismava em a deixar longe demais. Então ele saía da água, querendo fugir, mas descobria que o frio que fazia lá fora era mais do que podia suportar. E assim seguiam a luta; ele, nadador desesperado; ela, porto inatingível. Alguns diriam que havia poesia nesse bailar. Outros, que havia somente esforço inútil para não se afogar. Mas a verdade é que, enquanto ela se afastava, ele continuava a insistir. E cada braçada que dava no mesmo lugar não era um esforço para avançar – era apenas a vontade de a trazer até ali, sonhando com o dia em que a maré pudesse virar.
Quando ela apareceu e ele se viu completamente perdido, o universo parecia comum. Havia sol, havia árvores, havia vida. Só não havia ar. E então ela foi entrando, tomando conta, arrastando tudo como uma vaga do mar em tardes de inverno. A ele, apenas restava tentar colocar a cabeça para fora d'água e respirar, já que ir contra a correnteza de nada servia. Por isso, acabou se deixando levar e, quando viu, não podia manter mais os pés em terra firme. Enquanto isso, ela parecia sumir e voltar, seguindo a intensidade do oceano. Ali, o mundo era mudo. Ali, o coração era surdo. Às vezes ele tentava nadar em sua direção, crendo que era possível chegar até ela. Porém, o esforço era inútil, e o mar cismava em a deixar longe demais. Então ele saía da água, querendo fugir, mas descobria que o frio que fazia lá fora era mais do que podia suportar. E assim seguiam a luta; ele, nadador desesperado; ela, porto inatingível. Alguns diriam que havia poesia nesse bailar. Outros, que havia somente esforço inútil para não se afogar. Mas a verdade é que, enquanto ela se afastava, ele continuava a insistir. E cada braçada que dava no mesmo lugar não era um esforço para avançar – era apenas a vontade de a trazer até ali, sonhando com o dia em que a maré pudesse virar.
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