segunda-feira, setembro 24, 2001

Aniversário

Às vezes parece que você acorda do lado do avesso, que nem devia ter acordado. Parece que o mundo todo conspira contra você. Como hoje.

Não fui trabalhar, mas deveria. É meu aniversário, pensei, não preciso ir. Vai tudo dar certo. Não vou acordar cedo só para trabalhar duas horas e voltar. Não vou. Não fui.

Tinha um almoço marcado com quem eu mais queria ver no dia de hoje. Especialmente. Hoje. Não vou poder ir, disse ela, tenho que ficar estudando. Mas a gente pode ir só na loja de cd's, não serve, perguntou ela. Não respondi. Mas fui.

É meu aniversário, vai tudo dar certo, pensei.

O celular tocando. Várias vezes. Atendi. Parabéns vinham. E iam. Os problemas vinham. E ficavam. Eu ia.
Desmarquei os outros compromissos. Só eu podia resolver tudo pelos outros. Só eu. Assim não vai dar, assim não. Vai. Só, fui.

É meu aniversário, vai tudo dar certo, pensei.

Ela ficou em casa. Me deu um abraço longo. E um beijo. Na bochecha. Não fica triste, falou, vai tudo ficar bem. E entrou. Eu fiquei ali. Parado. Pensando. Não sei nem como voltei. Me fui.

Mas é meu aniversário, vai tudo dar certo, pensei.

O carro não ligou. Não acreditei. Olhei o marcador. Zero. A gasolina se foi. Toda. 20 litros. 35 reais. 8 horas de trabalho. Já acabou. Em dois dias. E eu fiquei. A pé.

Mas é meu aniversário, vai tudo dar certo, pensei.

Cheguei em casa. Sem almoçar. 5 horas na rua. Nem tudo resolvido. Liguei para ela. Não estava em casa. O celular. Atendeu. Queria falar. Com ela. Não podia, estava ocupada. Só às 8 da noite. Mas são só 5. E a casa tá vazia. Eu também.

Mas é meu aniversário. Vai tudo.

E eu vou.